quarta-feira, outubro 10, 2007
Filme " DOM ROBERTO" de ernesto de sousa (1962) no Cine-Teatro de Alcobaça
é verdade integrado no festival "Marionetas na Cidade 2007" já esta quinta-feira no pequeno auditório do Cine -Teatro de Alcobaça pelas 21.30h.Dom Roberto
de Ernesto de Sousa
com Raúl Solnado (João Barbelas), Glicínia Quartin (Maria), Nicolau Breyner (Homem de Negro) e Rui Mendes (Serafim)
Raúl Solnado em "Dom Roberto", de Ernesto de Sousa. (Col. Cinemateca Portuguesa)
Sinopse:
A vida miserável de João Barbelas, um vagabundo sonhador, a quem os miúdos alcunham "Dom Roberto", por exibir fantoches. Conhece Maria, rapariga com passado triste, julgando inocentemente ter arranjado habitação para ambos. O amor, a alegria de viver... Porém, a felicidade é traiçoeira: João e Maria perdem a casa que nunca for a deles, mas conservam a esperança e a ternura, embora a fome continue a persegui-los.
Observações
"Em Abril de 1959, (a revista) Imagem lançou a ideia de uma cooperativa para ajudar a financiar um projecto do seu novo director, o crítico de arte José Ernesto de Sousa (1921-1988). Cine-clubista da primeira hora (fundador do Círculo de Cinema em 1946), chefe de redacção da Imagem desde 1954, crítico de cinema de várias revistas, Ernesto de Sousa concebera o projecto de adaptar novo romance de Leão Penedo que, em 1952, dera a Manuel Guimarães a base para "Saltimbancos ". Tratava-se de Dom Roberto, história de um vagabundo sonhador e construtor de fantoches, em que perpassa muito do neo-realismo italiano e algum Fellini.
Dois anos demorou a conseguir a magra quantia de 600 contos necessária à produção. Finalmente, em 1961, as filmagens de Dom Roberto arrancaram, inteiramente à margem de qualquer apoio oficial e apoiadas apenas pelo entusiasmo do movimento cine-clubista. Raúl Solnado aceitou o papel principal, ao lado de uma actriz de teatro em princípio de carreira (Glicínia Quartin) e de outro show-man, depois popularíssimo: Nicolau Breyner. E a 30 de Maio de 1962, o filme estreou-se no Império - a maior sala de Lisboa - largamente publicitado como o primeiro filme novo de um cinema novo.
Se este estandarte era pela primeira vez invocado, as reacções dos críticos (já se havia extinguido a revista Imagem) deram claramente a entender que ainda não era aquele o Messias por que se esperava. Mas a etiqueta colocou-se-lhe e nenhuma história do cinema português se escreveu depois que não citasse Dom Roberto como acta do nascimento do cinema novo.
Hoje, é difícil descortinar no filme essa ruptura. Paradoxalmente, Ernesto de Sousa (que não mais voltaria à ficção cinematográfica) retomou o populismo dos filmes que tanto atacara como crítico e não logrou mais do que uma obra bem intencionada. Alguns notaram já à época - e com razão - que o filme - curiosamente usando como décor central um pátio sem cantigas - não ia afinal muito mais longe do que os "Saltimbancos" de Guimarães, dez anos antes. Mas, vistas as coisas de outro ângulo, não há dúvida que Dom Roberto foi (e por anos seria) o único fruto bacterstência quotidiana são convencionais, esquemáticas, vazias de qualquer sentido dramático. Ficam-nos alguns sentidos apontamentos de solidão, algumas imagens crepusculares, um tom digno na desfortuna do artista pobre, que Raúl Solnado interpreta com sensibilidade, firme, apesar de tudo, na frágil caminhada em direcção a um novo dia."
In Luís de Pina, História do Cinema Português, Ed. Europa-América, Col. Saber, 1986
"Na sua fragilidade, no seu isolacionismo, nas suas condições de produção, nas vagas heranças de que se reclama, na ruptura que pratica em relação ao estado das coisas no cinema português desse início dos anos 60, por tudo isto se não pode negar a Dom Roberto o carácter de augure do que viria a seguir, de João Baptista do Cinema Novo, que iria irromper com as dimensões de movimento cultural de uma geração. Quando este filme chega, o cinema português acabara de atravessar essa década de vileza que havia sido os anos 50. Aparece em pleno pântano, graças ao movimento cineclubista (de onde sai o essencial da organização da Cooperativa do Espectador que produz o filme) que era, recorde-se e sublinhe-se, o grande bastião da resistência cultural cinematográfica desses anos. Dom Roberto fez-se com a emanação dos cineclubes, como cinema pobre de meios, como atitude. Não admira nem o tom negro (tocado por um poético que os anos tornaram irremediavelmente bafiento - deixando o negro como coloração essencial), nem as cruzadas reminiscências neo-realistas, chaplinianas ou de um certo populismo do cinema português dos anos 40 (o pátio como comunidade boa e feliz), ainda menos espanta a mensagem de esperança (sem raiz, nem motivo, porque sim) que o encerra. Porque se há coisa que este filme queira é acreditar que o negro há-de gerar luz - mesmo que não saiba o processo de viragem.
A atitude de mudar não encontra um saber fazer técnico e estilistico que a transforme em cinema eficaz. Há pobreza de conteúdo, estereótipo nos personagens, a carpintaria fílmica é tosca e creio que os anos que passaram erodiram em larga escala Dom Roberto. Quase nada sobra senão Raúl Solnado, desarmado e tocante (o personagem de Glicínia Quartin deixou de ter qualquer ossatura), e essa estranha crença de que é possível construir um automóvel (um filme) à força de vontade. O Cinema Novo português anuncia-se como aquilo que tomo (arbitrariamente?) como metáfora: uma traquitana que é impossível funcionar e, porém, move-se."
Jorge Leitão Ramos, in Dicionário do Cinema Português 1962-1988, ed. Caminho, Lisboa, 1989
Festivais
Festival de Cannes 1963 - Menção Especial do Júri do Melhor Filme para a Juventude
Associação para a Promoção do Cinema Português
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