João Paulo Seara Cardoso, fundador do Teatro de Marionetas do Porto, já não pôde ver concretizado o seu sonho, que a partir de domingo fica registado na Baixa portuense.
O Museu das Marionetas do Porto abre as suas portas este domingo, na Baixa da cidade, com uma galeria que expõe as personagens que deram vida a 25 anos de história e de actividade do Teatro de Marionetas do Porto (TMP), cumprindo um dos sonhos do seu fundador, João Paulo Seara Cardoso (1956-2010).
Quem vai abrir as portas do novo museu, que ocupa três pisos de um renovado edifício na histórica Rua das Flores, é Isabel Barros, coreógrafa do Balleteatro, viúva de João Paulo Seara Cardoso, sua parceira de aventuras artísticas em ambas as companhias, e que entretanto “herdou” a direcção do TMP. A companhia está a comemorar os 25 anos, com um programa lançado já no passado mês de Dezembro com a abertura de uma primeira exposição-instalação na galeria da Rua das Flores, mas também com a reposição das suas principais produções.
“O museu resume-se a um sonho que o João Paulo tinha de partilhar o espólio da companhia, de todas as criações que foram feitas ao longo de 25 anos, com ele durante 23 anos”, resume, em declarações à Agência Lusa, Isabel Barros, que assume esta abertura “contra a corrente” do que se vive na cultura neste momento.
Isabel Barros lembra que “o espaço alugado há 10 anos” por João Paulo “estava completamente a cair e que precisou de obras muito profundas, com uma intervenção do arquitecto João Gigante”. Esse foi “um esforço feito inteiramente à custa da companhia e de esforço pessoal, sem apoios, que esperemos que cheguem depois de o museu estar aberto”, afirma a coreógrafa.
Para os muitos espectadores que aprenderam a apreciar as peças do TMP no exíguo espaço da Rua de Belomonte, bem ali ao pé, o novo museu oferece-se como oportunidade para um reencontro diferente com as personagens, porque o objectivo, segundo Isabel Barros, “é trabalhar a proximidade com as marionetas que não estão fechadas, apelando ao toque e a uma visita muito dinâmica, onde nós podemos explicar técnicas de manipulação”.
Os visitantes vão aí poder encontrar-se com os bonecos que fizeram as personagens de Miséria, Macbeth, Paisagem Azul com Automóveis, Bichos do Bosque, Cinderela, algumas das 38 peças que constituem o património do TMP e um percurso iniciado, na segunda metade da década de 1980, com o Teatro D. Roberto, cujo teatro de pano também está exposto.
“É muito emblemático o Teatro D. Roberto, porque é o mais tradicional, e é um espectáculo que foi feito por todo o país pelo João Paulo e que nós recuperámos agora para ser feito por uma actriz da companhia”, lembrou Isabel Barros.
No novo espaço da Rua das Flores vai ser também possível reencontrar Fredo Brilhantinas, o arrumador que, com uma série de personagens políticas locais e nacionais da época, fazia parte do elenco da emblemática revista Vai no Batalha (1993), que permaneceu em cena durante meses e se afirmou um dos maiores êxitos da companhia.
O Fredo Brilhantinas, que celebrizou frases como “não me bata na cabeça que eu ando a estudar à noite”, foi uma personagem criada por Seara Cardoso a partir da figura real de um arrumador do Largo de São Domingos, perto do Teatro de Belomonte, a quem o encenador entregava a chaves do carro. “Um dia chegámos lá e perguntaram ao João Paulo: ‘O senhor é que é o dono do Volvo? Olhe que esse carro caiu ao Douro’. Ainda chegámos a tempo de ver tirar o carro do rio. O arrumador tinha ido dar uma volta com ele e despistou-se; valeu 50 contos na sucata, e João Paulo nunca apresentou queixa contra ele”, recorda Isabel Barros.
Estas e outras recordações podem ser revisitadas a partir deste domingo, num museu que deverá mudar os bonecos expostos duas a três vezes por ano, “numa relação sempre dinâmica entre a companhia e o museu”, e que já iniciou um programa para visitas para escolas.
LUSA
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